quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

MOSQUEIRO

 

Autor: Graciliano Ramos

 

Pelo canto da ariramba

Pelo sorriso do teu olhar

Vejo a Bucólica mais linda

De beleza que não finda

Como a prata deste luar.

 

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C ’roa Grande no Marajó (WANZELLER-2010).

 

Tão distante a C’roa Grande

De lá parte um veleiro

É o Barão de Guajará

Atravessando o rio Pará

Para chegar ao Mosqueiro.

 

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Ilha do Mosqueiro vista do rio Pará (WANZELLER-2010)

O ESTUDANTE

 

Autor: Graciliano Ramos

 

Eu fui pra cidade

Estudar já me formei

Hoje retorno com saudade

Para quem eu sempre amei.

 

O navio está chegando

A maresia vai sumindo

O meu amor me esperando

A sua mão se erguendo.

 

Agora vou descontar

Os meus dias sem ninguém

Já vejo a hora de saltar

Te abraçar, te quero bem.

 

Eu só comia boi ralado

Em casa e na construção

O meu barraco pendurado

Na rua da solidão.

 

Eu comia o duro pão

Que o patrão amassou

Bebi água do camburão

Que nunca se clareou.

 

Mas valeu o sacrifício

Que passei para me formar

Troquei agora os edifícios

Pelas casas do meu lugar.

domingo, 19 de dezembro de 2010

S. O. S. SAMAUMEIRA

 

Autor: Graciliano Ramos

 

Sou de uma era secular

Numa floresta cresci

E vivi sem me cansar

Mas o progresso

Aqui também veio morar

Nesta terra onde nasci

Não me deixam sossegar.

 

A estufa

Já começa a me queimar

E o clima

Desta ilha-maravilha

Até quando

Vou poder purificar?

 

Esta selva

De concreto me aperta

Mas os japiins fazem a festa

Tentando me alegrar.

 

Sou a samaumeira gigante

Frondosa da natureza

Minhas lãs formam

Uma nuvem cintilante

Que o vento leva

Deixando o céu uma beleza.

 

Não corte os meus galhos

Pois são agasalhos

Da passarada que canta

E não se cansa.

 

Não ofereço perigo

Mas sim abrigo.

 

Nesta bucólica que encanta

Eu sou amazônica.

 

Distante sou bendita

O pescador me avista.

 

Não pedi pra nascer

Mas nasci pra viver.

CASCATA DE AMOR

 

Autor: Graciliano Ramos

 

Me perco nos teus caminhos

Aqui murcham as tuas rosas

E nas tardes sem teus carinhos

Lembro tuas mãos carinhosas

 

Aqui na serra vivo a sonhar

A noite esconde o triste dia

Meu pensamento a te procurar

Mas não encontro a minha Maria

 

Traz o teu abraço cortante

Aquele beijo rico de paixão

Jorrando água da tua fonte

Para irrigar meu coração

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

MALANDRO HONESTO

 

Autor: Graciliano Ramos

Sou malandro honesto

Gosto de trabalhar

Se casares comigo

Terás um grande amigo

Fome nunca vais passar

 

Eu trabalho de pedreiro

Sou mestre pra rebocar

Só um servente ligeiro

Trabalhando o dia inteiro

Pra poder me acompanhar

 

Meio-dia Sol a pino

A vida vou lhe ensinar

Mas sou um pouco ladino

O segredo não lhe ensino

Pra você não me enrolar

 

Nasci do lado norte

Mas um dia vou voltar

Aqui a vida é a morte

Lá o vento sopra forte

Pra palmeira balançar

 

Eis minha casa na esquina

Pra você ir morar lá

Doce lar que me fascina

De madeira quina a quina

Aroeira e jatobá

 

Sou filho do Norte

Bravo que nem o mar

Maçaranduba pra porte

Diamante de corte

Não sou fácil de quebrar.

CABRA MACHO


Autor: Graciliano Ramos


Vi o Sol se esconder no horizonte
Eis a noite chegando para nos ocultar
Uma ave sumiu lá no monte
Tirando rasante foi se abrigar
Um vento frio sopra areia na gente
Olhei para o ocidente
Clareou vi relampejar
 
Ao luar ao luar
No teu colo eu quero sonhar
 
Muita coisa pode acontecer
Escutando o gemido do mar
Vou te amar até o amanhecer
Pois ninguém vem perturbar
Somos lobos entre dentes
Dois corpos ardentes
Que vão se devorar
 
Ao luar ao luar
No teu colo eu quero sonhar
 
A coruja canta bem neste momento
Depois voa pra outro lugar
Ela vem com seu canto agourento
Como querendo nos assustar
De repente uma estrela cadente
Corta o imenso silente
Eu vi clarear
 
Ao luar ao luar
No teu colo eu quero sonhar
 
Testemunha a lua novamente
Tudo aquilo que vamos fazer
Eu beijando este corpo ardente
Me embrenhando dentro do teu ser
Nesta arte eu sei o que faço
Pois só cabra macho faz mulher gemer
 
Ao luar ao luar
No teu colo eu quero sonhar

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

MENINO ENJEITADO

 

Autor: Graciliano Ramos

Eu fui menino enjeitado

Eu já nasci malcriado

Não respeitava senhor

Ai! Como eu fui errado

Enganei mas fui enganado

Aqui é mesmo o inferno

Que julga um pecador.

 

Na arte do namorado

Amei mas fui desamado

No amor eu fui sofredor

Queria ser um doutor

Mas não frequentei a escola

O mundo foi meu professor.

 

Enfrentei a miséria do mundo

Eu passei fome no fundo

E nesta grande partida

Rumo à escola da vida

Me chamaram vagabundo.

 

Não tinha teto

Só tinha o chão

Não tinha amor

E nem paixão

Sempre descalço

Na rua sem direção.

 

Não tinha pai

Você não viu?

Não tinha mãe

Ela sumiu.

 

Pare! Não insista

Tem criança na pista.

Vá devagar

Que eu tenho pressa pra chegar!

 

Apelo do autor: Amigo mosqueirense, escolha os melhores candidatos para o Conselho Tutelar de nossa Ilha, no próximo dia 03 de dezembro!

 

Círio de Mosqueiro

 

Autor: Graciliano Ramos

 

Nessa manhã santa

Mosqueiro se encanta

Ninguém está só

O morador dá suspiro

Pois é o grande Círio

De Nossa Senhora do Ó.

 

Do Chapéu Virado

Este povo é levado

Pela corrente de fé

Segue a procissão

De vela acesa na mão

A multidão vai a pé.

 

Por onde ela passa

Alguém pede a sua graça

Outros a bênção

Nessa grande andança

O fogueteiro não cansa

De soltar o seu rojão.

 

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Chegada do Círio à Praça da Matriz. (FOTO: Jornal do Mosqueiro- 1987).

 

Ao chegar na Matriz

Este povo feliz

Que reza a manhã inteira

Pisa naquela serragem

Desenhada a imagem

Da Santa Padroeira.

 

O padre de pé

Recebe a Imagem com fé

E a conduz ao altar.

Muitos envergonhados

Revelam os seus pecados

Porém voltam a pecar.

 

A Barraca da Santa

Tinha muito mais graça

Na velha tradição

Pois a banda da Vigia

Tocava todo santo dia

Para a grande multidão.